miércoles, agosto 09, 2006

História de um machão – Parte 1

“Amanhã vou ver o jogo no boteco com meus amigos”, disse Navarro. “Sabe que gosto de futebol.” “Não precisa se explicar não”, retrucou Mercedes. Pronto. Aquela frase foi um golpe em Navarro. Um soco teria sido melhor. Sentiu-se humilhado.

“Quem ela pensa que é?”, pensou. Arrependeu-se profundamente da última frase. Foi retórica, mas soou como a frase de um pau mandado medroso. “Como fui burro”, esbravejou, agora em voz alta. Mercedes já não estava por perto.

Remoeu-se. “Ela precisa saber que não sou homem de me explicar para ninguém. Ela precisa saber. Logo eu? Eu, que fui cachorro de rua por tanto tempo... Sim, em mim ninguém põe coleira.” Isso era antes, na verdade. Porque desde que Mercedes entrou na vida de Navarro, ele mudou um pouco. Já não bebia tanto, já não via tantos os amigos. O futebolzinho e pôquer deram lugar a momentos com sua amada. Bonita, charmosa e inteligente. Assim era a mulher que tinha mudado sua vida. Arquiteta, Mercedes trabalhava como paisagista/decoradora. Era muito ligada à parte estética e estava sempre exuberante.

“O que eu vou fazer? O que eu vou fazer? Essa mulher me humilhou. Senti-me ultrajado na minha condição de macho.”

De repente, uma luz. A Janice. “Sim, a Janice, como não pensei nisso antes?” Janice era uma mulher do trabalho que vivia dando brecha pro Navarro. Ele se fazia de besta. Afinal de contas, havia nascido com um grave defeito: faltava nele o gene da putaria. Não conseguia trair. Chifrou duas namoradinhas da adolescência e se sentia mal por isso. O remorso o corroeu nas duas ocasiões. Com Mercedes então... estava limpo. Nunca tinha chifrado a moça.

Mas agora era diferente. Precisava dar uma lição nela. E Janice era uma boa lição. Tinha uma bunda bonita e um rostinho meia boca. Mas servia para a ocasião. “Ela vai ver só.”

Cancelou o boteco com os amigos, inventando uma desculpa qualquer; “Bicha!”, ouviu. Normal.

Radical, resolveu que tinha de dar a lição direito. No apartamento de Mercedes. “Nunca mais vai dizer que eu estava me explicando”, disse, ainda espumando e pensando em uma cena estilo Rubem Fonseca.

Fez de tudo para chegar antes na casa de sua namorada. Tinha as chaves, pois dormia lá umas três vezes por semana. Convidar Janice para uma esticada pós-trabalho não foi uma tarefa difícil.

Levou a colega de escritório para o apartamento da mulher. O porteiro estranhou, mas cumprimentou-o. “Boa noite, seu Navarro.” Eram 18h30. Mercedes chegaria por volta das 19h.

Abriu duas cervejas e pegou uns amendoins. Não queria ser romântico. “Não vou dar vinho para essa mulher. É muito caro e ela vai dar pra mim mesmo que eu ofereça tubaína”, raciocinou. Começaram a falar sobre amenidades, meter o pau no chefe. Uma extensão do papo de almoço, falar mal das pessoas da empresa.

Seu coração acelerava à medida que o tempo passava. O relógio na parede parecia o regulador de temperatura de uma sauna. Gotas de suor escorriam da sua testa. Não demorou muito para Navarro ganhar “duas pizzas” embaixo dos braços...De repente, o barulho do elevador... “Ela chegou”, pensou, dando-se conta que a esta hora já deveria estar, no mínimo, dando uns amassos na Janice. O tilintar das chaves causou-lhe um mal súbito. Mercedes abriu a porta. Antes que pudesse falar qualquer coisa, Navarro despencou, duro.

“Amor?” A namorada correu para acudi-lo. Janice, sem entender nada, se apresentou. Como já sabia que era apenas uma candidata a amante, inventou uma desculpa e foi procurar ajuda. Quando voltou com o porteiro, Navarro acabara de acordar nos braços de sua amada: “Ainda bem que você estava aqui para me salvar. Acho que passei mal com o calor. Esta é a Janice, minha colega de trabalho. Ela veio aqui para te pedir umas dicas de decoração, pois está se mudando”, disse, fazendo um sinal para a colega de trabalho.

Janice disse que as dicas poderiam ficar para outra hora, pois Navarro havia acabado de passar mal. “Muito prazer. Até logo.” “O prazer é meu. Desculpe pelo meu namorado. Marcamos para outra hora e te dou as dicas que quiser”, disse Mercedes, fechando a porta. Quando virou-se, viu Navarro deitado no sofá, com cara de cachorro sem dono.

8 Comentarios:

Blogger db dijo...

tem um Q de ser uma história de um amigo seu, nao é nao?

4:19 p. m.  
Blogger Márcia dijo...

"...ganhar “duas pizzas” embaixo dos braços" kkkkkkkkkkkk... essa nao conhecia!

5:13 p. m.  
Blogger FAFÁ dijo...

"Isto é uma obra de ficção, qualquer semelhança com a realidade é mera coencidência"

10:24 p. m.  
Blogger o_argentino dijo...

Vcs estão sempre querendo achar verdade nos textos... essa é ficção mesmo... deve ter acontecido algo parecido com alguém, mas juro que não conheço

12:36 p. m.  
Blogger db dijo...

“Não precisa se explicar não”, volta a retrucar Mercedes...

3:01 p. m.  
Anonymous Anónimo dijo...

Genial. Fantástico. Vc deveria escrever um livro de contos.

11:13 p. m.  
Anonymous Anónimo dijo...

Adorei.

1:19 p. m.  
Anonymous Anónimo dijo...

"História de um machão", ou "Pau mandado de merda, a missão"
;)

6:56 p. m.  

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