martes, mayo 27, 2008

We're a happy familiy

“Mas você não gostava de pizza quatro queijos?” “Não, nunca gostei deste troço!” Com esta frase, Joaquim causou espanto no filho...eles conviveram por 25 anos e o pai comia aquela pizza quase toda semana. E só agora, que cada um tinha sua casa e sua “vida” e apenas desfrutavam um momento especial de um jantar ‘quase’ em família, ele se sentiu à vontade para falar.

Marcelo e o irmão ficaram meio estarrecidos com o fato. Na verdade não pelo fato de o pai não gostar de pizza quatro queijos, embora até pudesse ser acusado de heresia ou de falha de caráter. Afinal, pizza é quejo! (E não ovo.)

O que intrigou os irmãos e os presentes e até arrancou risadas de uma das noras de Joaquim é que ele levou anos e mais anos para falar aquilo. Precisava ter passado anos comendo algo que não gosta só para agradar os filhos?

Alguém diz que foi uma prova de amor. Simples e quase tosca, mas uma prova de amor. Outro fala que ele foi tonto de passar tanto tempo comendo algo que não gostava só pra agradar aos filhos.

Com isso, Marcelo ficou com uma pergunta na cabeça: será que a vida em família é uma farsa? Será que as pessoas precisam mentir e fazer o que não gostam o tempo todo para não desagradar quem está ao lado? Mas e a personalidade de cada um? Pra onde vai?

Recém-casado, Marcelo guardou isso em algum lugar da sua mente. Anos depois, já com a pequena Letícia correndo pela casa, aquela passagem voltou à sua cabeça: “Papai, assiste o (sic) desenho das Meninas Superpoderosas comigo?” “Não, filha, eu não gosto.” “Então brinca comigo de amarelinha lá no pátio do prédio? “Não, filha, homens não pulam amarelinha.” “Então me leva para tomar sorvete de baunilha?” “Filha, você precisa saber de algo: eu odeio sorvete!” E foi para o banheiro, convicto de que sua pequena Letícia estava crescendo em um ambiente saudável, calcado em sinceridade e busca de personalidade.

martes, mayo 13, 2008

"Oh, well, whatever, nevermind...."

Juliano era um cara fechado. Fechado mesmo. Mas não falava pouco. Ele era fechado quanto às questões pessoais, seus mais profundos sentimentos e segredos. Porém em rodas de conversas era extremamente sociável. Conversava, ria, brincava. Dava opiniões, mas sobre três assuntos ele não se abria: família, trabalho e seus amores.

Acreditava que aquilo lhe pertencia e ninguém tinha nada a ver com sua vida. Nem com a própria família ele falava. Sua mãe queria saber o que passava por sua cabeça. Afinal, ele tinha 27 anos e ninguém sabia se estava feliz ou deprimido.

Quieto, sonhava com o dia em que poderia sair na rua sem que alguém o conhecesse. Não queria ter que cumprimentar ninguém. Adorava o anonimato, mas não o anonimato das salas de bate-papo da internet. Não tinha nada de voyeur. Ele só queria sossego.

Na hora do almoço, buscava sempre comer sozinho e ia para as mesas do canto dos restaurantes em que ninguém da sua empresa aparecia. Era amável com os garçons, garfava enquanto via TV.

Cansada de não saber o que ele pensava, a mãe, Edília, resolveu recebê-lo com uma saraivada de perguntas no dia do seu 28º aniversário. Comprou um bolo e o esperou no sofá. Não haveria festa, claro. Perguntou se o filho se sentia rejeitado. Perguntou se gostava da comida dela, perguntou se gostava do emprego, perguntou se era gay.

Juliano negou tudo, sem esforço. Deixou a mãe falando, pegou a mochila, saiu. Utilizou-se de um dos mais velhos clichês: passou na padaria, comprou cigarro e nunca mais voltou.

Seu quarto seguia intacto. Edília ainda esperava o filho voltar, cheia de culpa. O pai, a cada trago no cigarro, dizia que o filho era “vagabundo” e ingrato.

Três anos e meio depois, a mãe, maltratada pela tristeza, já com o rosto tomado pelas rugas, recebeu uma carta. A letra era de Juliano. Abriu-a correndo, quase rasgando seu conteúdo. Dentro, um bilhete, com uma foto:

“Mãe, vim pro Canadá. Casei com a Débora, aquela namorada que tive aos 17 anos e você odiava. Este é nosso filho. É só para você saber. Nunca mais vou voltar.”

O pai, que lia a carta sobre o ombro da mulher, saiu espumando, negando ao filho como um ateu nega a Jesus Cristo. A mãe, chorosa, abriu um sorriso. Foi a primeira vez que Juliano demonstrou algum sentimento e lhe disse o que estava pensando.