Depois de escutar pela milésima vez que não arrumava nada em casa e gostava de viver na zona, Ayala saiu de casa e foi trabalhar. O Outlook avisou que tinha uma reunião com a chefe. Ela ia distribuir suas responsabilidades entre algumas pessoas, pois estava para sair (ou entrar) de licença-maternidade. Juntando as férias, seriam seis meses longe da empresa.
“O médico quer antecipar o parto, devo sair daqui a 15 dias.” “Ok”, pensou Ayala. “Você vai ficar com controle, planilhas, escalas e tudo o que for de organização”, ouviu. Na hora, lembrou do esporro matinal: “Ué, mas justo eu, que sou desorganizado em casa, tenho que ficar com toda a organização aqui?”
Respirou fundo. Afinal, já fazia quase tudo aquilo mesmo. O lado bom de ter uma chefe que não faz nada é não ter muito a mais o que fazer na ausência dela. E é só trabalho mesmo. Se fosse bom, não chamaria trabalho. Trabalho é ir todo dia para um lugar chato, fazer coisas chatas, sorrir para quem não gosta, tentar manter a sanidade mental diante de verdadeiros pulhas para receber dinheiro e assim ter uma vida com o mínimo de dignidade, quem sabe até um certo conforto, como uma viagem para a Europa.
Depois da distribuição de tarefas, aproveitou o momento para perguntar quando poderia marcar as férias. Afinal, lá se vão dois anos de firma, estava na hora de usar umas das quatro coisas boas do trabalho outra vez: o mês de férias. A superior imediata da chefe grávida, levanta a voz: “Como assim sair de férias? Você não vai sair de férias! Ela vai estar em licença-maternidade!”, disse, em tom estridente, típico de uma mulher que usa mais chocolate do que rola, mas com sorriso nos lábios. Com o mesmo sorriso nos lábios, mas com a tranqüilidade de quem usa mais a rola do que come chocolate, Ayala devolveu: “Então por que ela resolveu ter filho eu não posso tirar férias? Vou engravidar também!”